Este texto foi publicado pelo nosso amigo M.A.R. no Ecos do Grupo n.º 10, de Setembro de 1993, pouco depois da inauguração da E.B. 2,3 de Alhadas (então C+S). Apesar da idade avançada, vale bem a pena ler esta magnífica peça.
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Um batalhão de tropas da Guarda Nacional Republicana e um corpo de homens da polícia antimotim da nossa vila, capturaram, pelas treze horas do dia de ontem, em pleno dia portanto, um bando de trinta e seis dos mais perigosos marginais da nossa praça. Em boa hora, aliás. Lembremo-nos do que tem sido este mês e meio de sofrimento, de suspeita, incomodidade e medo, com os nossos filhos expostos às piores atrocidades a que os podem sujeitar esses navalhistas, ladrões e drogados que andam sempre a rondar pela zona da escola. E como sabem que as pessoas sabem que antigamente eram os senhores elegantemente vestidos que vendiam a droga, eles vestem-se todos bardinas, cheios de esterco e piolho para ver se enganam, mas já não enganam ninguém.
Há vários anos que em Alhadas a escalada de terror se tornou inconcebível, senão vejamos: de noite ninguém anda descansado, em cada esquina um qualquer desses bandidos nos dá uma facada nas costas, quando não nos enfiam seringas cheias de sida. O descanso do comum cidadão é impossível com todo o ruído de motos a escape livre, de rallyes e slalons nas ruas principais, provocado por tresloucados assassinos que, no mínimo, matam doze pessoas por dia (por noite, de dia é mais!). As nossas estações de metro são colossais e tenebrosos guetos, conjunto de toda a escória mais reles, mais antisocial,, mais podre que pode existir. Nem em suas casas as pessoas se podem sentir seguras, porque os meliantes arrombam, vigiam, abrem, fecham, sabem os segredos, onde está o dinheiro, o livro de cheques, o vídeo, o microondas e a banheira e... não são raras as violações. De menores, maiores, médios e até famílias inteiras. Estuda-se a hipótese da construção de um grande reformatório para as vítimas destas sevícias.
Nem de noite nem de dia o comércio ou os serviços podem funcionar com a devida segurança. Os pequenos e grandes assaltos são constantes e há já uma mafia organizada que cobra dinheiro aos comerciantes para ficarem protegidos de futuros assaltos. Se recusarem a protecção, já se sabe, eles vão lá e escaqueiram ou saqueiam tudo e ainda fazem como já têm feito: matam as pessoas e cortam-nas aos bocados com facas da cozinha.
Os Correios, Posto Médico, dependências bancárias, Junta de Freguesia, a lavandaria Automat, só funcionam porque estão 24 horas vigiadas cada uma por 17 elementos fixos fardados, várias patrulhas regulares de móveis bélicos e ainda várias dezenas de agentes disfarçados das mais variadas pessoas e coisas, como aquele que teve de se desmascarar quando estava a fazer de árvore e o edil se lembrou que era a altura da poda das árvores dos espaços públicos.
O desemprego da juventude alhadense ronda os trezentos por cento, porque além dos nenhuns que trabalham, existem já os que nunca hão-de trabalhar e os que vão para fora desfazer o que os outros andam a fazer.
Num resumo macabro podemos dizer que, em Alhadas, roubo, prostituição, droga, tráfico em grande escala, violência diária, sangue nas ruas, selvajaria sem explicação, estão na ordem do dia. Não há no mundo lugar mais horroroso, mais perigoso, mais hediondo e desgraçado que esta vila, onde dantes era tudo tão lindo. Agora é só depravação, pouca-vergonha e perdição.
Pais, um conselho: fazei acordo com firmas de segurança para levarem as vossas filhas e filhos nos carros blindados de casa para a escola e da escola para casa (infeliz escola, mais valia que não a tivessem feito!).
Num mundo tão virado para a paz, tão redimido à concórdia e bom entendimento entre os povos; num mundo em que se conseguem já dispensar as tropas das Nações Unidas, aproveitando-os contudo para fazer as queimadas das grandes porções de droga capturada; num mundo onde conseguimos que, por exemplo, agora no Líbano se coma carne seis ou sete vezes por dia, compulsivamente, e se bebam excelentes champanhes franceses para acompanhar lautos manjares de pastéis de nata, arroz de tamboril e vienettas de chocolate; num mundo tão bom, que fez do appartheid uma mágoa do passado, conseguindo que agora brancos e negros, brancos e cor-de-rosa e pretos e bleques se entendam às mil e duas maravilhas; um mundo que tem vindo a melhorar de forma admirável. Despoluído, desarmado, sem assimetrias sociais; um mundo sem fome, sem guerra, sem criminosos, só de gente sã e progressiva. Em Londres, Rio de Janeiro, Los Angeles, Nova Iorque, cidade do México, La Paz, Medelín, as autoridades vêm para casa com indemnizações por não terem nada que fazer. Os que ficam ainda nas esquadras fazem jardinagem nas instalações, pintam as unhas, ministram cursos de Indigência (disciplina que veio substituir a História nos currículos actuais); num mundo destes, como se pode admitir tanta ladroagem, tanto assassino, tanto drogado, tanta destruição?! Somos realmente o covil dos degenerados, o reduto da podridão, o refugo da criação, o cancro galopante da sociedade.
Por este andar acabamos até por contaminar Portugal. E se chega a Lisboa, então nem quero pensar.
17 comentários:
Genial!
Podes crer!
Muito bom
Muito bom e muito boa a iniciativa de pôr aqui escritos do Ecos. Falo por mim que gosto de os ler e por não ter todos os (poucos mas bons) números que saíram.
Um Conto de... está de regresso! Esperamos rever-te por lá!
umcontode.blogspot.com
Texto excelente.
Uhmmmm, este texto acontece uns meses antes do grande incendio na Figueira, que pôs a arder a Serra e tudo e ao redor... alguém se deve ter chateado com alguma coisa que o MAR disse e meteu fogo a tudo...
Grande MAR, Grande texto, e mais textos de números antigos do ecos que alguém tenha e possa postar faça o obsequio.
este corisco ainda escreve.
tenho de lhe foder a cabeça para publicar aqueles textos que estao la refundidos no fundo da gaveta.
mesmo assim um texto completamente actual, as alhadas não mudaram
nadinha,continua a mesma coisa.
este corisco ainda escreve.
tenho de lhe foder a cabeça para publicar aqueles textos que estao la refundidos no fundo da gaveta.
mesmo assim um texto completamente actual, as alhadas não mudaram
nadinha,continua a mesma coisa.
Tá a fazer eco pá
eco de uma opinião desfasada, com certeza
Fabuloso.
Foda-se! Não percebo tanta admiraçõ. O gajo é meu famíliar. Isto explica tudo não é?.
admiração
O cepto se não ficas admirado é porque já leste isto vezes sem conta, e leste provavelmente ainda mais do MAR. Vê se colocas aqui alguma coisa que tenhas dos números do ECOS.
Grato
Teria muito prazer. O tempo é escasso. Vou tentar.
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